Fenômenos climáticos são sempre difíceis de serem administrados, mesmo quando previstos. Estava no Litoral Norte em 23 de fevereiro de 2023, quando choveu 620 mm em menos de 24 horas naquela região.  As precipitações do Rio Grande do Sul foram da ordem de 220mm e, embora menores comparativamente, se prolongaram por  muitos dias com consequências devastadoras.

Há muitas semelhanças (guardadas as devidas proporções) entre esses dois eventos, como a falta de energia elétrica, a falta de sinal de celular, corte do abastecimento de água potável e o isolamento impedindo deixar o local por qualquer meio que não fosse o transporte pelo mar, complexo, caro e perigoso.

A tragédia gaúcha, ainda em curso, permitiu relembrar o período em que fui funcionário da Philips –empresa de origem holandesa e que me proporcionou conhecer Eindhoven onde se concentrava naquela época, a matriz da empresa.

Relembrar esse período não possui qualquer oportunismo ou nostalgia. A experiência de conhecer um país cujo território está em sua maior parte abaixo do nível do mar contém ensinamentos que, passadas mais de 4 décadas, permanecem vivos.

Os impactos e choque de culturas é o objetivo desse texto e se passadas as tais tantas décadas muitas coisas permanecem vivas o choque havido marcou toda a minha vida profissional e parte da própria vida.

Naquele país os desastres e catástrofes estão à espreita e fazem parte da vida de toda a população e desde tenra idade todos aprendem a evitar que se tornem ameaças reais. Cuidar da segurança de todos que dependem de diques, pontes, canais e bombas de recalque de água é tarefa permanente.

As semelhanças entre os diques, comportas e volumes excessivos de água existentes na Holanda e no Rio Grande do Sul são inescapáveis para quem conheceu a Holanda e participou, como funcionário, de uma organização e conviveu como os cidadãos holandeses.

As estradas de rodagem, as vias férreas e as moradias, muitas delas  abaixo do nível desses canais. Estranho (para os estrangeiros, como eu) ver embarcações navegando acima dos trilhos por onde correm os trens.

A confiança mútua entre os cidadãos e a responsabilidade de cada um pela segurança de todos infunde profundo respeito ao modo de vida naquele país.

Finalizando vale contar (muitos já sabem disso) que o pátio de estacionamento de automóveis segue um princípio de solidariedade discretamente praticado. Aqueles que chegam mais cedo ao trabalho estacionam mais longe do portão principal de entrada do pessoal deixando as vagas mais próximas para os que chegam em cima da hora, evitando terem que percorrer apressadamente as distâncias do veículo estacionado e a porta principal.

O que os gaúchos estão vivenciando nesses últimos dias talvez resulte num experimento de solidariedade poucas vezes visto. Cada qual ao seu modo e cada qual à sua maneira poderá contar para o seu vizinho, seus parentes e para os seus descendentes esses momentos que a história há de registrar.

Paulo Westmann

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